A falta de produto adequado para dessecação da soja, que é a aplicação preparatória de herbicida a fim de deixar a lavoura uniforme para a colheita do grão, está preocupando os produtores de Mato Grosso.
O presidente do Sindicato Rural de Nova Mutum, na região médio-norte do estado, Paulo André Zen, conta que reduziu a dose do herbicida para tentar dessecar uma área de soja que cultivou, mas a quantidade não foi suficiente e não teve a eficiência esperada no campo.
Ele conta que está apreensivo com o resultado da safra. “Com a redução da dose, a planta estende mais esse processo de dessecar. Eu não sei se é o tempo chuvoso que a gente teve nos últimos dias com um sol forte e intenso, mas a planta está alongando mais o seu ciclo. Temos plantas com 25% prontas para colher; 40% em estado amarela; e o restante verde. Dentro de uma lavoura você tem três estágios. Devido a falta desse produto [dessecante], a lavoura está desparelha, o que vai interferir na produtividade final da safra porque certamente este que já está pronto pra colher vai chegar ardido, vai estragar o grão”, afirma.
Paulo Zen conta que é grande a preocupação com a falta de produto específico para dessecação das lavouras no município, onde foram cultivados mais de 400 mil hectares de soja.
“Estamos com 40% da soja colhida e temos produto para mais 20% ou 30%, no máximo. A maioria dos produtores está com essa deficiência e não tem perspectiva de receber esse produto”, conta.
É o caso do produtor rural Euclides Brancalione. Até agora, o agricultor só recebeu 30% dos 1.300 litros do herbicida que comprou com antecedência. O insumo seria usado para dessecar todos os 1.500 hectares de soja. Com o ciclo de 110 dias já fechado, o agricultor precisou pedir produto emprestado para tentar garantir a dessecação.
“Promete que vem, mas chega só um pouquinho. O resto não vem, e a soja não espera não espera no campo. A soja vem, mais oito dias está tudo boa pra colher, isso preocupa porque a gente tem o produto comprado, e tem a hora certa de aplicar. Com a dose certa, a colheita seria bem melhor”, diz.
Sócio-proprietário de uma revenda em Nova Mutum, Márcio Aquino Souza, afirma que a escassez de dessecantes também prejudica o setor que, segundo ele, tem se esforçado para tentar cumprir os contratos.
“Não está entregando simplesmente por não querer, ela não está guardando produto para vender mais caro, ela não tem, ela não recebeu produto do fornecedor e ela não está conseguindo cumprir, da mesma forma que ela corre o risco de não receber a conta do produtor também depois pela dificuldade que ele está tendo, tem falta de Imidacloprid, tem falta de Acefato, tem uma gama de produtos. A nossa cobrança com os nossos fornecedores é diária, duas três vezes no dia ligando, pedindo um posicionamento e a resposta é sempre a mesma, que vai chegar, mas não tem um prazo definido. Nós tivemos que fazer várias manobras para não deixar os nossos clientes na mão nesta hora que ele realmente precisa, temos uma expectativa que na safra 23/24 o mercado se normaliza a nível mundial e com isso a gente consiga ter um atendimento de qualidade ao nosso produtor, mas eu acredito que na safra 22/23 ainda terá falta de produto”, revela.
O empresário diz ainda que o Diquat, molécula considerada específica para dessecação das lavouras de soja, também está em falta no mercado e relaciona a baixa oferta do produto à proibição do uso do Paraquat.
“A proibição do uso do Paraquat acarretou em um uso muito alto de Diquat. E são poucas empresas que produzem esta molécula. O Paraquat era uma molécula mais genérica, então você conseguia um volume maior e conseguia atender toda a cadeia. E hoje não, hoje você está preso a uma única molécula com poucas empresas produzindo”, diz.
Segundo o secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, José Guilherme Leal, a cadeia de fornecimento está passando por dificuldades em todo o mundo. “No momento que o Brasil precisava comprar mais Diquat pra suprir a ausência do Paraquat, não foi possível conseguir isso no mercado internacional”, diz.
Ainda de acordo com Leal, o retorno do Paraquat depende de novos estudos. “Não podemos discutir com a Anvisa sem a produção de novos estudos, no ponto de vista de saúde pública. O que nós estamos procurando é colocar mais registros à disposição dos agricultores de Diquat e também outras fontes que possam ser alternativas substitutas do Paraquat. A gente tem priorizado a análise desses produtos”, complementa.
A escassez dos produtos específicos para dessecar a lavoura também gera outra preocupação: as consequências do eventual uso de herbicidas considerados inadequados para este tipo de manejo.
Segundo o engenheiro agrônomo Naildo Lopes, existem alguns produtos no mercado que depois da aplicação é necessário um tempo de carência até o início da colheita.
“Pode ter algum produto que deixe algum residual, a gente não sabe, e de repente esse produto pode ser recusado em uma exportação. A dessecação, atualmente, ela entra mais para uniformizar a maturação, porque se essas áreas não forem dessecadas e elas forem secando e não secar igual, as vagens e os grãos que secam primeiro até a outra chegar e ficar no ponto de colheita para ter umidade ideal pra você não ter desconto começa apodrecer, e com esse período de chuva apodrece, perde a qualidade do produto e o produtor vai ter desconto”, explica.
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